CANHOTICES

...em Torres Novas, Ribatejo, Portugal. Do lado esquerdo da vida.

31.10.08

A dor de cotovelo do Dr. Soares

Publicada por zemanel |

Do que vos vou relatar, posso ser suspeito. Mas não escondo a minha opinião nem a minha indignação pela mais recente provocação de mau-gosto que Mário Soares fez a Álvaro Cunhal.
A coisa conta-se rápido.
Mário Soares visitou o Museu do neo-realismo em Vila Franca de Xira.
E não se conteve e lá debitou a cassete do costume. Mas para lá disso, conforme se vê no vídeo seguinte, armou-se em crítico de arte e foi por aí fora: Para Soares, Álvaro Cunhal nunca foi um escritor ou pintor- embora desenhasse bem.
Vivemos em democracia e felizmente todos podemos ter opiniões.
Cunhal, enquanto Manuel Tiago foi escritor. E há o Cunhal pintor, ou o Cunhal ensaísta, ou o Cunhal tradutor de Shakespeare, o Cunhal que prefaciou Ferreira de Castro. E nisto tudo, Álvaro Cunhal não terá atingido a excelência. Como escritor não terá merecido o Nobel e como pintor, não valerá como Picasso.
Mas ignorar que Cunhal foi isto tudo, e que o foi com um traço de qualidade no mínimo aceitável é revelador da personalidade de quem o ignora. Sobretudo porque Cunhal tendo sido tudo isto, foi ao mesmo tempo um lutador pela liberdade dos portugueses, com uma dura vida política clandestina, de entrega ao seu Partido e ao Povo português, com dezenas de anos de cárcere incluindo alguns em isolamento total.
Tudo isto, tudo junto, fazem de Cunhal mais do que um político. Embora nas coisas todas que se faz na vida, estamos a fazer política. E a arte de Cunhal era uma arte de intervenção política - mas com todos os elementos com que se considera algo como uma obra de arte.
Mas quando o DR Soares refere que Cunhal foi um apenas um "excepcional político" está a querer dizer uma coisa muito diferente.
Soares tem uma experiência bem mais curta. Culturalmente falando a sua mente brilhante nunca produziu nada além de fumaça...
Por isso bem sabemos qual é a ideia de Soares de querer reduzir Cunhal à sua dimensão de homem político.
Porque aí, Mário Soares, julga que fica mais próximo de Cunhal. Quer Cunhal na intriga partidária.Julga que de entre os dois é ele o vencedor da História. Mas se o muro de Berlim caíu , aquilo que vamos vendo da evolução do Mundo, até está longe de se confirmar Soares como o vencedor da história.
Soares, que é esperto, sabe que para falar de Cunhal tem que o reduzir. Fazer dele um mero actor político. Para assim, ele próprio se comparar perante as suas plateias de aduladores.
No fundo, Soares, quando fála de Cunhal, está sempre a ver o homem-político com quem fez aquele debate célebre na televisão em 1975.
Mas olhe que não, Dr Soares.
Álvaro Cunhal, nas suas múltiplas dimensões humanistas foi de facto uma das figuras centrais do século XX português. Foi muito mais que um homem reduzido à conspiração partidária.
Está de longe de ser intocável á crítica.
Viveu longe da perfeição.
Mas nem na terceira idade, precisou de andar a debitar idiotices e a revelar muita, mas mesmo muita dor de cotovelo.

Vejam o vídeo do MIRANTE TV



Nota final: os ingleses separam Policy da politic. Infelizmente o nosso latim não dá para tanto. Mas em jeito de remate diremos que toda a obra de Cunhal é Policy. Soares nunca saíu da Politic. E isso é algo que se nota que o aflige muito,sobretudo, nestes seus últimos anos de vida. Por isso os programas de televisão com Clara Ferreira Alves, as entrevistas a "leaders" mundiais... Em tudo isto Soares que mostrar a sua imagem de homem da Policy e não um mero homem da politic.

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