Num pequeno canto do "Expresso" de ontem, na secção desportiva, deparámos com uma notícia daquelas que nunca serão manchete, nem assunto de discussão de café, mas que revelam bem o lastimável momento que se vive em Portugal.
Segundo a notícia, duas mulheres foram eliminadas no acesso ao curso de nível máximo de treinadores precisamente por serem mulheres!
As duas mulheres excluídas cumpriam os segundos e quartos requisitos de admissão e houve homens admitidos que ingressaram no curso, à sua frente, cumprindo apenas com o quinto requisito.
O Segundo requisito de admissão conferia prioridade a candidatos com mais de 15 internacionalizações pela selecção A e o quarto critério destinava-se a favorecer treinadores da II divisão nacional.
As candidatas em causa cumpriam tais requisitos.
Ora segundo a Federação Portuguesa de Futebol, as candidatas em causa foram excluídas porque embora treinem equipas de futebol feminino da 2ª divisão feminina em Portugal, tal não foi considerado dado que o Futebol Feminino , de acordo com a Federação , " não tem carácter profissional" ou aproximado.
Mais grave ainda é a discriminação relativa ao segundo critério: a Federação não considera válida contagem de participações na selecção de futebol A...feminina - que joga representando a própria FPF, com as cores do país e em provas da UEFA e da FIFA!
No entanto esta mesma Federação, que recebe verbas chorudas do Estado ( não o esqueçamos ), tem o despudor de dizer que " a selecção nacional AA é indubitavelmente a selecção sénior masculina" !!!!
Em todo o mundo o futebol feminino é uma realidade. O desporto no feminino é uma das conquistas da Humanidade e que é valorizado em todos os países onde o respeito pela igualdade de oportunidades tem um mínimo de consideração. Apenas em sociedades retrógadas, geralmente dominadas por governos de origem teológica fundamentalistas, este tipo de argumentações são admitidas.
A Comissão para a Igualdade parece que já enviou para a Federação de Futebol uma recomendação censurando esta situação - recomendação que deve ter seguido para o caixote do lixo.
Esta poderia ser apenas uma notícia perdida, num canto de um semanário, paradoxalmente publicada num dia em que os media passaram o dia a insuflar-nos a cabeça com um "decisivo" play-off com a Bósnia Herzegovina. Enquanto os Decos jogavam na televisão as futebolistas portuguesas continuam enfiadas numa burkha....
Infelizmente não se trata apenas de uma pequena notícia. Ela é a notícia que reflecte um olhar muito claro sobre o estado de desenvolvimento da sociedade portuguesa.
Somos definitivamente um país pobre, em que se empobrece a trabalhar, um país de desempregados e precários, de reformados miseráveis, que pouco ou nada produz e em que a saúde e a educação são apenas acessíveis a alguns.
Mas a esta triste realidade económica junta-se uma profunda miséria de desenvolvimento social, onde todos estamos envolvidos que se reflecte na pobreza de produção,difusão e consumo cultural; na ausência de participação cívica ( que começa na ausência à reunião dos condomínios dos prédios onde vivemos) e política; no desprezo pelo património natural, monumental e cultural; na ditadura do futebol sobre todos os desportos e pelos vistos na ditadura do futebol dos machos sobre as mulheres e por aí fora...
Depois vêm coisas como as do Vara envolvido com o sr sucateiro e fazemos de conta que ficamos muito espantados.
Como se tudo isso, não não fosse o resultado natural deste Portugal dos pequenitos do século XXI, triste, medievo e a precisar urgentemente que se dê a volta a isto, coisa que não é impossível e para a qual vale a pena lutar.
Decididamente.
Vamos a isto?
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