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...em Torres Novas, Ribatejo, Portugal. Do lado esquerdo da vida.

2.2.07

DELIBERAÇÃO COMPLETA DA ERC

Publicada por zemanel |


Está on line no site da ERC a deliberação 3 -RG-I/2007.


Desculpem lá esta pequena seca...
Conselho Regulador da
Entidade Reguladora para a Comunicação Social
Deliberação
3/RG-I/2007
Pedido de apreciação de rigor jornalístico da notícia publicada no
Jornal Torrejano, de 3 de Novembro de 2006
Lisboa
24 de Janeiro de 2007
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Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social
Deliberação 3/RG-I/2007
ASSUNTO: Pedido de apreciação de rigor jornalístico da notícia publicada no Jornal
Torrejano, de 3 de Novembro de 2006.
I. Identificação das partes
1. Em 10 de Novembro de 2006 deu entrada, nesta Entidade, uma “Queixa/Pedido de
esclarecimento” remetida pelo cidadão José Manuel Alves Mota Pereira, contra o
“Jornal Torrejano”, relativa a uma peça publicada por este periódico, em 3 de
Novembro de 2006.
II. A queixa
2. Está em causa uma notícia titulada “Francisco Louçã em Torres Novas: As
dificuldades aumentam, o país está certamente a andar para trás”.
3. No essencial, suscitam-se questões de rigor informativo, designadamente quanto à
utilização de expressões como:
(i) “A Alcaidaria do castelo de Torres Novas encheu-se”, quando não se terá
especificado o número de presentes;
(ii) “Francisco Louçã que é já tido por muitos torrejanos”, quando não se terá
esclarecido quais e quantos os torrejanos em causa.
(iii) “o único que vem explicar o que se passa no país”, quando não se terá
deixado claro se a expressão é da jornalista ou de outros cidadãos.
(iv) “vinda do Líder do Bloco à cidade por diversas vezes nos últimos tempos”,
sem se enumerar, alegadamente, a quantidade de vezes e o lapso temporal em causa.
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4. O denunciante questiona se, de facto, não estaremos perante “um défice de
objectividade jornalística, tendo a jornalista emitido a sua opinião por via de uma
entidade vaga e abstracta, criada por si e funcionando como o seu alter ego, neste caso
‘os torrejanos’?”
5. Solicita-se que a ERC faça cumprir “os preceitos de objectividade, isenção, rigor e
factualidade jornalística”.
6. Acrescenta que a polémica abrangeu igualmente observações incluídas no seu blog,
às quais a jornalista autora daquele artigo terá dado resposta numa coluna de opinião do
jornal em referência.
III. A posição do denunciado
7. Notificado, ao abrigo do disposto no número do artigo 10º dos Estatutos da ERC,
aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, o Jornal Torrejano pronunciou-se
nos seguintes termos.
(i) Esclareceu que “[o]s torrejanos sabem, em geral, que a sala da alcaidaria
alberga cerca de 200/230 pessoal” nomeadamente porque “é nela que se realizam
todo o tipo de comícios, sessões, debates, palestras, encontros, festas, sendo um
espaço fisicamente conhecido por torrejanos”.
(ii) Que quando a jornalista coloca a expressão “único que vem explica o que se
passa no país” o faz “entre aspas, exactamente para indicar que não é uma afirmação
sua, mas uma expressão ou tendência que terá constatado no contacto com as
pessoas e os meios políticos em que se move no exercício da sua profissão.”
Defende que se trata de “um traço de reportagem, uma nota expressiva, com algum
grau de subjectividade, é certo, mas nenhum género jornalístico (nem uma simples
notícia) é quimicamente ‘puro’, como se sabe”.
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(iii) Relativamente à questão das visitas de Francisco Louçã, o jornal questiona se
deveria ter sido elaborado “um relatório de visitas do líder bloquista”.
Acrescentando que considera tratar-se “de uma questão verdadeiramente absurda”.
8. Para além da resposta às alegações do denunciante, o Jornal acrescenta que:
(iv) Se é certo que o partido de que o alegado queixoso é dirigente concelhio,
sempre foi historicamente uma força política com um peso eleitoral significativo em
Torres Novas, “[a]contece que nas últimas eleições legislativas o Bloco de Esquerda
ultrapassou o PCP/CDU, colocando-se como terceira força política no concelho”.
Segundo o mesmo, os “9 por cento de votos no BE não serão uma votação residual”,
“daí o incómodo para os militantes e simpatizantes comunistas do concelho, questão
que nos ultrapassa completamente”.
(v) Por várias vezes publicou textos do denunciante e que, caso tivesse sido
solicitado, nunca lhe seria negado qualquer esclarecimento. Sendo certo que seria
escusada uma apreciação de um conjunto de questões “que parece remeter,
simplesmente, para um ressentimento de uma força política contra outra”.
IV. A competência da ERC
9. A Entidade Reguladora para a Comunicação Social é competente para apreciar a
matéria em discussão, nos termos do preceituado na alínea c) do artigo 7.º dos seus
Estatutos, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro (de ora em diante
“EstERC), que dispõe que “[c]onstituem objectivos da regulação do sector da
comunicação social a prosseguir pela ERC (…) [a]ssegurar que a informação fornecida
pelos prestadores de serviços de natureza editorial se pauta por critérios de exigência e
rigor jornalísticos, efectivando a responsabilidade editorial perante o público em geral
do que se encontram sujeitos à sua jurisdição, caso se mostrem violados os princípios e
regras legais aplicáveis.”, bem como do preceituado na alínea a) do número 3 do artigo
24.º do mesmo diploma que prevê que “[c]ompete, designadamente, ao conselho
regulador no exercício de funções de regulação e de supervisão (…) [f]azer respeitar os
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princípios e limites aos conteúdos difundidos pelas entidades que prosseguem
actividades de comunicação social, designadamente em matéria de rigor informativo e
de protecção dos direitos, liberdades e garantias”.
V. O direito aplicável
10. Está em causa o respeito pelo dever de rigor informativo, previsto no artigo 3º da
Lei de Imprensa, que dispõe que “[a] liberdade de imprensa tem como únicos limites os
que decorrem da Constituição e da lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade
da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida
privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem
democrática”.
VI. Análise
11. A peça em causa é uma reportagem da cobertura da deslocação do líder do Bloco de
Esquerda, (doravante BE) a Torres Novas, assinada por uma jornalista que acompanhou
essa visita. Trata-se de uma peça na qual a autora para além do relato de factos e da
citação de palavras do líder do BE introduz elementos de valorização das suas palavras
através de expressões como “(...) Constatados este factos, Francisco Louçã não hesita na
resposta a dar a José Sócrates”, “Quanto à questão do aborto, o líder do BE lembrou que
o que está em causa (...)”, “Louçã foi mais longe (...) ou “E assim, Loução explicou
(...)”.
12. Para além disso, a peça insere em discurso directo, com aspas, a frase “Francisco
Louçã [que] é já tido por muitos torrejanos como o único que vem explicar o que se
passa no país”. sem a atribuir a qualquer fonte.
13. Trata-se, pois, de saber se as práticas usadas na peça em análise constituem ou não
quebra do rigor informativo.
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14. A reportagem é um género jornalístico que possui uma estrutura organizativa mais
flexível do que uma peça estritamente noticiosa. Numa reportagem é reconhecida ao
jornalista uma margem considerável de interpretação dos factos, isto é, a fronteira entre
informação, interpretação e opinião não é tão rígida. Assim, relativamente às citações
supra citadas, atendendo ao contexto em que surgem considera-se que elas se integram
no tipo de afirmações que não excedem a margem de interpretação própria de uma
reportagem, não obstante nos casos citados no ponto 11 supra devesse ser mantido um
maior distanciamento face ao protagonista da peça.
15. Já no que se refere ao uso de uma citação em discurso directo sem atribuição de
fonte, ao contrário do que alega o jornal, constitui um desvio aos cânones tradicionais
do rigor jornalístico. Ora, tratando-se de uma reportagem nada impediria a autora de
assumir como sua a interpretação quanto à lotação da sala que acolheu o acontecimento
relatado, sem necessitar de a atribuir a terceiros que depois não identifica. Contudo,
noutras partes do mesmo texto as citações dos protagonistas da reportagem encontramse
devidamente atribuídas.
16. Perante o exposto, pode concluir-se, em síntese, que no texto em análise:
- Não foi ultrapassada a fronteira que numa reportagem separa informação e
interpretação;
- Não foi, por conseguinte, posto em causa o rigor informativo.
VII. Deliberação
Tendo apreciado uma queixa de José Manuel Alves Mota Pereira contra o Jornal
Torrejano, por alegada falta de rigor informativo na notícia titulada “Francisco Louça
em Torres Novas: As dificuldades aumentam, o país está certamente a andar para trás”,
publicada na edição de 3 de Novembro de 2006, o Conselho Regulador da ERC, no
6
exercício das competências previstas na alínea a) do número 3 do artigo 24.º dos seus
estatutos, delibera proceder ao arquivamento do processo.
Lisboa, 24 de Janeiro de 2007
O Conselho Regulador da ERC
José Alberto de Azeredo Lopes
Elísio Cabral de Oliveira
Luís Gonçalves da Silva
Maria Estrela Serrano
Rui Assis Ferreira

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